Folhas
Poema repetido para Kierkegaard
O banho fez o dia.
A manhã nasceu depois de se lavar.
Tudo o resto automatizou-se
Na engrenagem das peças
E fez-se um.
Lavar é o secretariado da prontidão,
haja ou não no ar
o espírito de melancia da relva cortada.
(Os palpos da aranha deixam de fazer
sentido nos cantos.)
Desejar a água é a natureza
das plantas
E repeti-lo é saber contar
os dias (são ciclos e ciclos.)
O tempo deixa ver-se
na mudança dos corpos
entre as estacas da partitura
(imagem terrível a de uma flor
a metamorfosear-se num fruto).
Lavar (repetir) é isto:
dar a outra face
ao tempo
e, por esta via, impedir a corrupção
silenciosa
que,
no fim,
produziria os nossos monstros
irreconhecíveis.
Da capo
Fine
Abigail Ribeiro
1 de setembro de 2022
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