Metamorfose da Palavra
A palavra muda
Primeiro é barro e depois é vaso
E depois é caco e depois é pó.
Para ser refeita precisa de ser amolecida
Com água.
Plasme-se, pois, a poça no chão, verta-se a chuva,
Resvale a água montanha abaixo,
Suba o oceano,
Para que se dê a metamorfose da palavra.
E esta, que era estéril,
Dê um milhar de sementes
E estas, atiradas à terra,
Dêem milhões de árvores.
Venha a palavra nos frutos,
Mas também nas dores
E nos bocejos
E ainda no riso e na comichão,
Que a palavra cuidada é mais transparente que vidro
E mais forte do que ferro.
A palavra é o prato onde se serve o alimento,
O receptáculo do caldo
E a própria colher.
Mas é também a boca e o suco gástrico,
O intestino e a absorção.
A palavra digere-se
Numa ampulheta de vidro
E esconde-se atrás do silêncio.
Enrosca-se entre duas mãos
E opera o mundo na sua transformação.
Abigail Ribeiro
11 de dezembro de 2021