O Silêncio
O silêncio
é uma palavra difícil?
Uma sala grande
onde o vazio
é ensurdecedor?
Onde eu vivo
não há o rio
do tempo
e a sala do silêncio
é soalheira,
um lago de luz,
onde, por vezes,
as águas se turvam.
As artérias do tempo
pulsam-te visivelmente
nos punhos,
no pescoço
e nas têmporas.
No meu corpo, porém,
não há tecidos,
vasos,
líquidos
onde o tempo possa
dissolver-se.
E o que lês
no braile do silêncio
tem as marcas
de aguilhões
que te agridem.
Mas, repara.
São marcas.
É a dor
fantasma em membro
de outrora?
Não ter tecidos, vasos, líquidos
não me iliba
da autoria da violência
que a falta do rio
inflige nesse corpo
irrigado.
O que as artérias levam
e as veias colhem
do silêncio
desagua na leitura
tumultuada de água doce
e salgada
e o diagnóstico
é ausência de coração,
mas também pode ser
dislexia.
Abigail Ribeiro
28 de Janeiro de 2023
Imagem: quadro da autoria de Jan Van Der Kooi